O ultraje de Veneza e o Crucifixo de Viena

Paradise Faith

(Roberto de Mattei, A Ordem – 25 de outubro de 2012) É muito difícil imaginar um atentado contra a fé cristã mais blasfemo e provocador do que o que foi levado ao écran  no Festival de Veneza a 31 de Agosto, com a projecção do filme Paradise Faith (A fé do Paraíso), de Ulrich Saidl. O filme atinge o ponto culminante numa cena em que a heroína, a actriz Maria Hoffstatter, faz um uso indecente do crucifixo. É inútil que entremos em pormenores, que seriam ignóbeis, mais convém ainda assim lembrar que para um cristão não há símbolo mais sagrado que o crucifixo, que representa Jesus Cristo, Deus feito homem, morto na cruz para livrar os homens dos seus pecados. Toda a fé cristã se resume na pregação de Cristo crucificado.

O escândalo de Veneza não é um caso isolado, já que se vem inscrever num quadro de cristianofobia cada vez mais inquietante. A peça de teatro de Romeo Castellucci,, Sobre o conceito do Rosto de Deus, levada à cena em Milão no mês de Janeiro, não é senão o primeiro de muitos episódios que foram tendo lugar ao longo de todo o ano. Ainda assim, o Festival de Cinema de Veneza é um caso muito mais estrondoso: trata-se aqui de uma verdadeira vitrina internacional, para a qual se precipitaram os jornalistas de todo o mundo para daí mostrarem, sem qualquer vergonha, o conteúdo desse filme blasfemo, que além disso ainda veio a receber um prémio especial do júri.

A Santa Sé fez uma intervenção a 12 de Setembro com uma declaração bem firme: « O profundo respeito pelas crenças, textos, grandes personagens e símbolos das diferentes religiões é condição essencial para a coexistência pacífica entre os povos.» A apresentá-la foi o Padre Federico Lombardi, porta-voz do Gabinete de Imprensa do Vaticano. Todavia, infelizmente, este apelo não diz respeito ao caso da blasfémia de Veneza, mas sim a um outro filme, produzido na América, A inocência dos muçulmanos, que se considerou estar na origem das violentas manifestações que tiveram lugar na Líbia e noutros países árabes.

«As gravíssimas consequências dos insultos e provocações injustificados contra a sensibilidade dos crentes muçulmanos — escrevia numa nota o Padre Lombardi — são, nos últimos dias, e uma vez mais, coisa bem evidente, devido às reacções que suscitam, por vezes trazendo até resultados dramáticos, que, por sua vez, vêm agravar a tensão e o ódio, desencadeando uma violência absolutamente inaceitável.» O que se passou na Líbia não seria, pois, o resultado de um plano delineado desde há meses pela Al-Qaïda contra o Ocidente, mas sim a consequência inevitável dos «insultos e provocações injustificadas contra a sensibilidade dos crentes muçulmanos».

Mas por que será que os insultos e provocações injustificadas contra a sensibilidade dos crentes católicos, como os acontecidos no Festival de Veneza, também não são considerados «injustificáveis»? Será apenas por que não levam a consequências, nem graves, nem modestas que sejam?

Muito poucas pessoas vieram recordar que o que se passou na cidade de Benghazi não é a consequência do inútil filme anti-Maomé, mas antes da política franco-americana que cedeu o Médio Oriente ao Islão, a qual, sob o pretexto da justiça reparadora, teve como momento crucial o apoio prestado pela NATO aos fundamentalistas de Benghazi contra Kadhafi. E se contra o filme anti-ilslâmico, o mundo inteiro se pôs a protestar, já ninguém veio protestar contra o filme anticatólico, que foi projectado publicamente e se destina ao circuito da grande distribuição, sem que ninguém a isso se oponha.

É este o verdadeiro problema dos dias de hoje. Não temos apenas a perseguição dos cristãos que acontece em terras islâmicas, temos também a cristianofobia no Ocidente. Mas, acima de tudo, temos ainda a fraqueza e a cumplicidade do Ocidente em face desta cristianofobia. E, infelizmente, também faz parte deste sistema de cumplicidade, a automutilação dos meios eclesiásticos.

O beato Marco d’Aviano, sobre as colinas do Kahlenberg, avistando Viena, brandia o crucifixo com um objecto de combate e de vitória, para incitar as fileiras cristãs para que libertassem a cidade ocupada pelos muçulmanos. Hoje, o crucifixo não é mais do que um instrumento que se usa sórdida e indecentemente numa sociedade hedonista que se destrói entregando-se ao Islão. (Roberto de Mattei)

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