A Terça-feira Santa

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De todos os dias da Semana da Paixão, aquele em que talvez menos se medita é a Terça-feira Santa. Este dia, porém, é tão importante e intenso como poucos na vida de Nosso Senhor. É o dia que, de facto, encerra a Sua pregação pública. É o último dia apostólico de Jesus, observa Mons. Landucci, o dia da Sua última grande batalha (Maria Santissima nel Vangelo, Edizioni Paoline, Roma 1954, pp. 332-337). Uma batalha que conhece três fases: duas no templo, diante das multidões, e a terceira a caminho do Monte das Oliveiras, de regresso a Betânia apenas com os discípulos.

A primeira fase da batalha tem lugar no Templo e o ataque parte dos inimigos de Jesus. São Mateus relata que, entrado no templo, enquanto ensinava, aproximaram-se d’Ele os sumos sacerdotes e os anciãos do povo e disseram-Lhe: «Com que autoridade fazes isto? E quem te deu tal poder?» (Mt 21, 23). À autoridade que Jesus tinha recebido do Seu divino Pai, os fariseus e os saduceus contrapõem a sua autoridade, que sentem estar a ser desafiada e que reivindicam duramente.

Jesus não se retrai da controvérsia: inicia um cerrado confronto dialéctico com os Seus inimigos, que se conclui com as Suas terríveis palavras: «“Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os construtores rejeitaram transformou-se em pedra angular? Isto é obra do Senhor e é admirável aos nossos olhos? Por isso vos digo: O Reino de Deus ser-vos-á tirado e será confiado a um povo que produzirá os seus frutos. Quem cair sobre esta pedra, ficará despedaçado; aquele sobre quem ela cair, ficará esmagado”. Os sumos sacerdotes e os fariseus, ao ouvirem as suas parábolas – continua o Evangelho –, compreenderam que eram eles os visados. Embora procurassem meio de o prender, temeram o povo, que o considerava profeta» (Mt 21, 42-46). «Então, os sumos sacerdotes e os anciãos do povo reuniram-se no palácio do Sumo Sacerdote, que se chamava Caifás, e deliberaram prender Jesus, à traição, e matá-lo. Diziam, porém: “Que não seja durante a festa, para não haver alvoroço entre o povo”» (Mt 26, 3-5). Jesus fala abertamente, os Seus inimigos conspiram na sombra, mas Jesus desmascara os seus planos passando ao contra-ataque. É a segunda fase do confronto, aquela que ocupa todo o capítulo 23 do Evangelho de Mateus e contém a célebre invectiva de Jesus: «Ai de vós, doutores da Lei e fariseus hipócritas (25); guias cegos (24); porque sois semelhantes a sepulcros caiados (27); serpentes, raça de víboras, como podereis fugir à condenação da Geena? (33)». E, posteriormente, o lamento final: «Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te são enviados! Quantas vezes quis reunir os teus filhos, como a galinha reúne os seus pintainhos sob as asas, e tu não quiseste! Pois bem, a vossa casa ficará deserta» (Mt 23, 37-38). Jesus já tinha chorado sobre Jerusalém dois dias antes, no Domingo de Ramos, vaticinando o seu castigo: «Virão dias para ti em que os teus inimigos te hão-de cercar de trincheiras, te sitiarão e te apertarão de todos os lados; hão-de esmagar-te contra o solo, assim como aos teus filhos que estiverem dentro de ti, e não deixarão em ti pedra sobre pedra, por não teres reconhecido o tempo em que foste visitada» (Lc 19, 42-44).

No terceiro momento desta densa jornada, que se desenrola no regresso a Betânia, respondendo aos discípulos, que de longe admiravam a grandeza do Templo de Jerusalém, Jesus diz-lhes: «Não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído». E preanuncia, com uma linguagem apocalíptica, as tribulações do fim do mundo, das quais a destruição do Templo é uma prefiguração. Depois, ainda nas palavras de São Mateus, o dramático selo do dia: «Tendo acabado todos estes discursos, Jesus disse aos discípulos: “Como sabeis, a Páscoa é daqui a dois dias e o Filho do Homem será entregue para ser crucificado”» (Mt 26, 1-2).

São palavras que deixam consternados os discípulos, que não compreendem totalmente o seu significado. Aquela que tudo compreende é a Virgem Maria. Ninguém sofreu mais do que Ela ao ouvir estas palavras, mas ninguém melhor do que Ela compreendeu o significado salvífico deste momento e aceitou-o com um amor por Deus tão imenso a ponto de superar a Sua dor. Foi também neste momento que Maria se revelou como Co-Redentora do género humano. Maria, diz o Evangelho, guardava cada palavra de Jesus, meditando-a no Seu coração (Lc 2, 19). As palavras de Jesus são palavras de vida eterna e o Imaculado Coração de Maria conservou-as para a eternidade. É n’Ela e com Ela que devemos meditar a Paixão de Jesus, esperando o triunfo do Seu Imaculado Coração com a mesma confiança com que só Ela, na hora das trevas, esperava a Ressurreição de Jesus Salvador.